Coleção 2020
Fundação Casa Grande
Fundação Casa Grande – Memorial do Homem Kariri
Alemberg Quindins e Rosiane Limaverde, músicos de formação popular, iniciaram em 1985 uma pesquisa etno-musical sobre os mitos e as lendas do povo da Chapada do Araripe, vale do Cariri cearense que resultou em 1992 na criação da Fundação Casa Grande-Memorial do Homem Kariri, uma Fundação Privada, sem fins lucrativos e Não Governamental (ONG), Utilidade Pública Federal, Certificada pelo Conselho Nacional de Assistência Social- CNAS e condecorada em 2004 com a Ordem do Mérito Cultural pela Presidência da República do Brasil.
A Fundação tem como objetivos pesquisar, preservar, coletar, juntar em acervo, comunicar, exibir e publicar para fins científicos, de estudo e recreação, a cultura material e imaterial do homem Kariri e de seu ambiente. Em 2009, a Fundação Casa Grande recebeu do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional- IPHAN, a outorga de ‘Casa do Patrimônio da Chapada do Araripe’.
Para contar sobre essa experiência empírica e viva da Casa Grande, ninguém mais apropriado do que os seus próprios fundadores.
Por isso, escolhemos trechos da dissertação de doutoramento em Arqueologia de Rosiane Limaverde:
“ARQUEOLOGIA SOCIAL INCLUSIVA – A FUNDAÇÃO CASA GRANDE E A GESTÃO DO PATRIMÔNIO CULTURAL DA CHAPADA DO ARARIPENOVA OLINDA, CE, BRASIL“, orientada por Maria da Conceição Lopes e apresentada à Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra em Novembro de 2014.
A Ciranda Cirandinha de Filmes convida a todos a adentrarem nessa experiência pelo olhar e corpo vivido de Rosiane!
“A Fundação Casa Grande utiliza dos conhecimentos sistematizados pela arqueologia, no delineamento de soluções práticas e caminhos frente aos problemas concretos da comunidade de Nova Olinda, Chapada do Araripe, Brasil.
Essa comunidade através de suas crianças, pôde legitimar a herança do patrimônio arqueológico como guardiãs da memória local, construindo cidadania e dignificando suas próprias vidas. Essas heranças revividas, foram recriadas e retransmitidas pelas próprias crianças na construção da cidadania: Inventariando, conhecendo, preservando, partilhando e divulgando os antigos e novos saberes.
Com essa experiência, pôde-se ainda inferir que a arqueologia deve sim, proporcionar e desenvolver os interesses científicos e sociais de produção de conhecimento sobre a herança cultural numa pequena comunidade, inserida em um macro contexto arqueológico, como a Chapada do Araripe e o Nordeste do Brasil. Neste processo de entrega do patrimônio cultural à contemporaneidade a arqueologia inscreve um potencial fundamental de desenvolvimento de uma Arqueologia Social Inclusiva, embasada numa experiência concreta, mas ao mesmo tempo intangível de reafirmação de identidade.
(…) antes mesmo da Casa Grande abrir suas portas, centenas de olhinhos curiosos já fitavam o interior da casa pelas frestas das janelas e das portas. Ao abri-las, a Casa Grande foi literalmente ‘invadida’ por muitas crianças que vinham de todos os lados da cidade, das pontas de rua e queriam escutar aquelas cantigas e narrativas das lendas, dos mitos, dos artefatos e fotografias indígenas que emolduravam as paredes da Casa. Foi assim que surgiu os primeiros pequenos condutores que espontaneamente guiavam casa à dentro mostrando o acervo arqueológico aos visitantes que ali chegavam e para eles contavam as lendas e recriavam os mitos do povo Kariri…
Nova Olinda poderia ser apenas uma típica cidadezinha nordestina de 15 mil habitantes, daquelas sociedades que Lévi-Strauss classificaria de “sociedade simples”, ou seja, aparentemente harmônicas e resistentes as mudanças em suas culturas, oferecendo melhores condições para a identificação das estruturas mentais inconscientes (…)
Seria muito comum a outras cidades do interior do Brasil em seus problemas sociais emergentes como subemprego, defasagem escolar, falta de perspectiva de vida, falta de saneamento básico e onde a palavra “arte” é apenas sinônimo de traquinagem da molecada na rua.
Mas Nova Olinda teve a sorte de ser o palco de uma ação protagonizadora com as suas bases firmadas no patrimônio arqueológico como uma ferramenta de inclusão social galgada na experiência de protagonismo juvenil das crianças e jovens inseridos na Fundação Casa Grande-Memorial do Homem Kariri e como cenário o patrimônio cultural da Chapada do Araripe. Surgida de um ideal imaginado através das narrativas das lendas e mitos dos povos da Chapada do Araripe e resultante de uma pesquisa etnomusical de um casal de jovens músicos, a Fundação Casa Grande foi protagonizada desde o seu princípio pelas crianças do Município de Nova Olinda.
(…)
O nosso desafio no início da Fundação Casa Grande, foi o de promover uma ação educativa que proporcionasse a esses meninos e meninas do sertão do Brasil ferramentas formadoras e norteadoras para a ampliação do repertório cultural, gerando perspectivas e oportunidades de inclusão social. Tudo isso só seria possível pelo acesso, vivência e internalização de novos saberes e conteúdos de qualidade em assuntos que ampliassem o repertório, como: Memória, Identidade, Patrimônio, Mitologia, Arqueologia, Gestão Cultural, Meio Ambiente, Arte, Cidadania, Turismo Comunitário e Sustentabilidade. Eu posso dizer que neste caso, a memória foi o elemento constituinte do sentimento de identidade, tanto individual como coletivo das crianças e jovens na medida em que ela também se tornou a partir do protagonismo dessas crianças e jovens, um fator extremamente importante do sentimento de continuidade e de coerência da comunidade e de sua reconstrução de si.
O início do percurso deu-se por meio da nossa pesquisa sobre os sons e a musicalidade dos mitos, o que revelou um outro território encantado do Cariri e também os vestígios arqueológicos do homem pretérito que habitou o vale da Chapada do Araripe, promovendo a criação de um Museu de referência sobre a pré- história regional – o Memorial do Homem Kariri – para acolher o acervo doado por populares através de descobertas fortuitas20.
Depois de restaurada a Casa, as crianças de Nova Olinda, chegaram ao espaço e se identificaram com as cantigas e histórias que narravam os mitos e o acervo pré- histórico dos primeiros habitantes da Chapada do Araripe. Com o tempo, a novidade do museu foi dando lugar ao sentimento de pertencimento aquele espaço, um ambiente onde os mitos e lendas contadas por seus avós, estavam ali personificados e justificados nos artefatos líticos e cerâmicos dos antigos parentes indígenas. Aquelas crianças foram os primeiros guias mirins do Memorial e atualmente, acompanhados de profissionais qualificados, realizam a gestão, mapeamento e monitoramento ambiental dos sítios arqueológicos da Chapada do Araripe. A comunidade também teve sua identidade e autoestima valorizadas pelos seus mais dignos representantes, às crianças, e apreenderam o significado do Memorial do Homem Kariri como parte de suas vidas. (…)” Rosiane Limaverde
Era uma vez uma Casa Azul
Educação Patrimonial
Exposição Tempo de Brincar
Letícia Diniz é fotógrafa e diretora da Tv Casa Grande, onde dirige a série 100 Canal. Em 2019, lançou a sua primeira exposição “Tempo de Brincar” na Galeria de Artes da Fundação Casa Grande. Na Ciranda Cirandinha de Filmes, participa da roda de conversa Na infância para a infância.
100 Canal
O 100 Canal foi criado para divulgar a produção da TV Casa Grande para a comunidade de Nova Olinda após a ANATEL ter proibido à sua transmissão e lacrado a TV, em 2000 e passou em 2002 a ser exibido no ritual das programações do Teatro Violeta Arraes – Engenho de Artes Cênicas.